A lei brasileira prevê que conteúdos referentes a história e cultura afro-brasileira devem ser ministrados em todas as etapas escolares, da ensino infantil ao ensino médio, marcando presença em todas as disciplinas. Implementar a lei 10.639/03, no entanto, segue sendo um repto para o país, mesmo depois 21 anos de aprovação.
Especialistas entrevistados pela Filial Brasil trazem orientações sobre porquê levá-la para as salas de lição e mostram que a implementação vai além de conteúdos formais e passa, às vezes, exclusivamente pela promoção de diálogo entre os próprios alunos e por abordagens por segmento dos professores que considerem as diferentes realidades.
A professora e escritora Sheila Perina de Souza estuda no doutorado da faculdade de ensino da Universidade de São Paulo (USP) uma lanço delicada do ensino, a alfabetização. Ela pesquisa o ensino do português influenciado por algumas línguas africanas. Além de contribuírem com o vocabulário, porquê por exemplo, com a termo moleque, que vem do quimbundo, uma língua falada em Angola, elas têm outro tipo de influência: “Quando usam o plural, muitas vezes as crianças, principalmente de classe popular, marcam o plural uma única vez, logo dizem: ‘Pega os livro’. Elas não marcam o plural ‘Pega os livros’. Isso é influência das línguas de origem banto, que trazem a marcação do plural no início e não no plural”, explica.
A forma com que a escola lida com situações porquê esta faz toda a diferença na formação das crianças. Se tratam exclusivamente com um erro, criticando a párvulo, ou se têm uma postura acolhedora. “Tento observar de que modo o racismo linguístico, que muitas vezes é confundido com o preconceito linguístico, é tratado na alfabetização, nesse período da escolarização que é de fundamental valia para a relação que a párvulo vai estabelecer com o conhecimento”, explica Souza.
São questões porquê esta que as escolas precisam mourejar diariamente e sobre as quais a 10.639/03 e as diretrizes para aplicá-la tratam. Cada lanço de ensino tem peculiaridades que precisar ser levadas em consideração e também questões para as quais as escolas devem estar atentas.
Instrução infantil
Na ensino infantil, lanço que compreende a creche e a pré-escola, segundo Souza, a literatura tem sido uma porta fundamental para a implementação da lei 10.639/03. Para além dos livros, é verosímil trabalhar as artes, a música e também as danças.
“A linguagem músico é fundamental, quando a gente olha para o que nós oferecemos para nossas crianças no cotidiano, quais as músicas que nós apresentamos. Nós apresentamos músicas de diferentes povos, conseguimos trazer músicas de diferentes etnias e aprofundar”.
De conformidade com a professora, ao apresentar uma música, pode-se não exclusivamente expressar que é de África, mas explicar que é de determinado país, de determinada região.
“A nossa origem é marcada por relações de poder que são construídas por meio da raça também. Portanto, é a gente olhar para músicas que tradicionalmente são músicas da cultura da puerícia e questionar se essas músicas dialogam com o currículo, com o que queremos edificar, porque temos um repertorio de música que crianças têm aprendido que possuem um texto racista”, ressalta a professora.
A coordenadora executiva adjunta da Ação Educativa, Edneia Gonçalves, acrescenta que para além de proporcionar materiais e brincadeiras, é preciso que os professores estejam atentos às interações entre as crianças. “Trazer o desvelo para ver porquê as crianças se aproximam. Na hora da roda [se alguém diz algo como]: ‘não vou pegar na mão dela porque é preta’. Isso é super geral. Que tipo de mensagem está trazendo, que tipo de ensino está trazendo. Quando não se traz a história dos ancestrais dessa párvulo e não ressignifica a presença negra na história brasileira, se faz a mesma coisa, rejeita não só o corpo porquê a linguagem ancião da párvulo”, diz.
Nesta lanço é preciso também, de conformidade com Edneia Gonçalves, estar discreto às referências que são apresentadas às crianças, aos personagens que são apresentados, prometer que também se assemelhem às próprias crianças e às famílias. Verificar também porquê os personagens negros aparecem nas histórias infantis e que tipos de heróis são apresentados.
Ensino fundamental
O ensino fundamental compreende do 1º ao 9º ano, período em que as crianças aprendem a ler e também período em que passam a ter mais um professor e começam a fazer uma transição para o ensino médio, deixam puerícia e entram na juventude.
Também nesta lanço, segundo Edneia Gonçalves, é preciso olhar para os textos que são apresentados e, caso eles possuam conteúdos racistas, isso deve ser indicado, contextualizado e discutido.
A emprego da lei vai além das áreas de humanidades, devendo ser considerada nas exatas e nas ciências. “A África tem um conjunto de jogos para trabalhar a matemática. Primeiro, exige uma pesquisa mais ampla, porque nossa ensino é eurocêntrica. Vamos buscar personagens, referências e matrizes africanas para trazer, vamos pensar a África antes da colonização. Isso no ensino fundamental é necessário. Ensinar a África anterior à colonização e pensar depois o período de colonização. Isso exige pesquisa, mapas, novos textos e novas fontes”, explica.
No campo da linguagem, Gonçalves diz que se pode considerar os sistemas de notícia e linguagem que são anteriores ao sistema ortográfico que usamos. “Sempre no sentido de ampliar o conhecimento. [O conteúdo] tem que cruzar [várias disciplinas] e quando atravessa, exige que professoras e professores também se preparem e que as redes façam formação dos educadores”, diz.
Ensino médio
O ensino médio é a última lanço da ensino básica. É também a lanço com as maiores taxas de evasão. “O ensino médio tem o enorme repto que é o repto da juventude negra, as suas culturas, porquê é que a gente está trabalhando a cultura negra juvenil”. A coordenadora explica que é muito importante que os professores também escutem os estudantes, ensinamento que vem do educador e filósofo Paulo Freire e da ensino popular.
“Os alunos sabem. O nosso trabalho é fazer surdir o conhecimento que esse estudante tem para que esse conhecimento se articule com o nosso conhecimento para produzir transformações tanto na aprendizagem do estudante, quanto do professor. Saber o que esse estudante sabe faz com que a gente tenha chegada aos territórios que esse estudante percorre e isso vai ter aplicações para todas as áreas de conhecimento”, diz Edneia Gonçalves.
Ela acrescenta: “uma guerra de slam [batalha de poesia falada], por exemplo, você ouve e pensa onde esse jovem adquiriu todo esse repertório se escola não está ensinando isso? Quer expressar que existe um envolvente de circulação de cultura e conhecimento que a escola tem que acessar também”.
Nesta lanço, a coordenadora ressalta que também é importante que seja feita uma ensino antirracista, que redesenhe a narrativa da história brasileira, trazendo a perspectiva da resistência da população negra. Nesse sentido é importante saber e levar para as salas de lição as histórias traçadas pelos movimentos sociais.
“Sempre, em qualquer uma das etapas escolares, você segmento do princípio de que é função social da escola proferir o conhecimento sistematizado pela ciência com o conhecimento das diferentes culturas para que a gente produza aprendizagem significativa para todas as pessoas”, sintetiza Gonçalves.